Essas coisas, logo aí embaixo... Palavras ditadas por um Ghost Writer.

30 de mai. de 2009

Admirável Velho Mundo

O fenômeno Susan Boyle diverte os medíocres e mostra a face triste de nossa sociedade consumista

A primeira vez que tive contato com o famigerado vídeo de Susan Boyle, agora uma pop star, mas no registro campeão de acessos na internet, caloura de um programa que procura revelações da música britânica, foi através de um colega de trabalho. No video postado no youtube, a cena, de cerca de nove minutos, mostra como a figura bizarra de Susan Bayle, pelo menos para os padrões de beleza atuais, com seus cabelos desgrenhados e secos, suas sobrancelhas grossas, sua cintura larga de quem está acima do peso e com um vestido nem um pouco fashion, enfrentava os jurados que a encaravam com ar de deboche, e em seguida entoava um canto com sua voz magistral, surpreendendo a todos.

Surpreendendo a todos. Isso é o que mais se ouve sobre o fenômeno Susan Boyle. Já devo ter recebido uma duzia de email sobre Susan Boyle, esbarrado com ela em blogs, páginas de internet, programas de tv, no rádio. Nenhuma mídia deve ter escapado dela. E o assunto sempre gira em torno disso: “Vejam como Susan Boyle, surpreende os jurados”. Mas não é isso que os leva a repercutirem tanto o assunto Susan Boyle. Não são apenas os jurados que se surpreendem com a performance da cantora inglesa. È toda a sociedade.

E se ela cantasse mal? Terrivelmente mal? Certamente cairia para a categoria dos personagens bizarros que se aventuram nesse tipo de programa de calouros, por fama, falta de noção das suas possibilidades vocais, ou seja lá por que diabos os levem a se exporem ao ridículo, para diversão da plebe. A questão é que isso seria esperado pela audiência. Para a público, uma pessoa dita feia para os padrões de beleza contemporâneos, cantar mal, é tido como normal. Porquê?

Os antigos gregos esculpiam estátuas dos corpos humanos procurando a proporção perfeita das partes, tentando assim atingir o mais alto nível físico de excelência. A perfeição física era associada a perfeição da mente, do espirito humano (por favor não confundir espírito com alma). Mens sana in corpore sano. Mente sadia num corpo são. Se isso fosse verdade Aristóteles seria burro como uma porta, afinal como sua face era terrivelmente desproporcional. Mas os gregos não queriam se contradizer, por isso nem tocavam no assunto.

Os romanos, por sua vez, copiaram dos gregos o conceito de perfeição plena. Mas na história da humanidade os padrões de beleza já mudaram muito. As gordinhas já estiveram muito em alta na renascença, onde ter carne em excesso não era um pecado. Homens já usaram perucas ridículas. As mulheres rebocavam a face com tanto pó branco que pareciam até fantasmas. Não existe uma perfeição, só a perfeição que se projeta.

Estamos na era do consumo. As coisas valem o quanto nos são úteis. Pessoas não são diferentes. Feios, que não tem habilidades que os destaquem, não tem utilidade alguma. Se Susan Boyle fosse uma cantora ruim, teria utilidade, pois seria cômica. Se fosse razoável, não teria utilidade nenhuma, pois não fugiria da média. Como boa cantora ela surpreende o público. Um feio devia fazer coisas feias. Uma pessoa bonita coisas bonitas. O sofismo por fim vence a razão. E Susan Boyle encanta o mundo medíocre cheio de ideias retrogradas. O nosso admirável velho mundo.
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2 comentários:

Cristiano Dalbem disse...

e se começassemos a encarar o fenômeno como a ignição de uma revolução da imagem, não seria isso algo completamente válido?
porque não é novamente o bizarro - voz linda num corpo terroroso - que chama a atenção e que o torna popular, mas sim esta "prova" tão "concreta" de que os padrões de hoje são uma afronta ao que há de mais verdadeireiramente bonito.

Lisiane de Assis disse...

Acho que a questão não é só de ela ser feia e cantar bem. Quem faz o "fenômeno" é a mídia e sua necessidade de dar mais destaque para determinadas notícias, de escolher alguma coisa para dar um tom sensacionalista, sempre. No Brasil, anteontem foi o caso Isabela, ontem com a chegada de Ronaldo ao Corinthians (com direito até a entrada ao vivo no Jornal Nacional quando marcou o primeiro gol), hoje com a chegada do "Imperador" ao Flamengo.

Não tinha me manifestado ainda sobre este caso, porque acho tão desnecessário, pois querendo ou não, mesmo escrevendo um texto em tom de crítica em um blog, ao exagero da mídia, como muitos estão fazendo, não deixa de ser uma forma de dar pano pra manga, e é isso que os "donos" do agenda setting querem.